sexta-feira, 6 de maio de 2016

Animais e Humanos: a falsa inocência dos animalismos

Os "defensores dos animais" que se opõem, por vezes violentamente, às corridas de touros como se elas fossem o cúmulo da imoralidade, habituaram-nos a uma argumentação moral que, na sua generalidade, parece evidente e portanto irrefutável: não devemos maltratar os animais, não devemos "infligir-lhes sofrimentos inúteis", etc. 
Mas como toda a moral exige uma fundamentação, as correntes "animalistas" recorrem a uma argumentação de ordem ontológica e classificatória. Ontológica: definir o que é "um animal" e definir o que é "um ser humano". Classificatória: situar cada um destes conceitos em relação ao outro, distinguindo-os, ou assimilando-os. O que é interessante e, como veremos extremamente perigoso do ponto de vista duma moral comum, é que a partir da relativização e até do apagamento da fronteira entre a animalidade e a humanidade, estes movimentos não se contentam com afirmar que "o animal é um semelhante do Homem" e por isso "deve ser tratado da mesma maneira", "como pessoa". A consequência recíproca (se quisermos, simétrica), que consiste em afirmar que as pessoas, ou pelo menos algumas delas, podem e devem ser tratadas como animais, também faz, com toda a lógica, parte da mesma ideologia animalista. Um "belo" exemplo, já o encontrámos na mensagem precedente, no programa do tal partido PAN. 
"No entanto, tem sido recorrentemente negado aos animais uma construção idêntica [à das pessoas morais] que lhes assegure mais direitos, como acontece com menores e outras/os interditas/os" (sublinhado meu).
Desta citação que já tínhamos visto, reclamando mais "direitos" para os animais, convém tirar essa mesma consequência simétrica - tratar os humanos como animais como já acontece com menores, etc. O essencial aqui é que a "pessoa" e os direitos aferentes à personalidade da pessoa, é encarada como um artifício que pode ser declarado limitado, extensivo, completo, etc. Nesta escala, teríamos "pessoas" parciais - menores, interditos, etc. e animais, e no outro extremo "pessoas" completas - adultos detentores de todos os direitos. Ora a qualidade de "pessoa" não é quantificável, não se pode ser "mais" ou "menos" pessoa.
Não se trata de negar uma evidência: existem pessoas com restrições quanto a certos direitos: trata-se, sim, de não confundir o facto jurídico (mais ou menos direitos) com o facto essencial: as pessoas com direitos jurídicos restritos são essencialmente pessoas completas, ontologicamente iguais às outras, com a mesma dignidade moral essencial (perdoe-se a repetição necessária) e completa. Até os direitos, no plano estritamente jurídico são idênticos, apenas o seu exercício é limitado. Por exemplo, um menor não pode vender nem gerir a sua herança (exercer os direitos aferentes à propriedade), mas herda-a por direito próprio e é plenamente sua.
De modo análogo, o paciente incapacitado (momentânea ou até permanentemente), o idoso com funções cognitivas diminuídas, são pessoas na plena acepção da palavra.
Pretender tratar os animais como humanos tinha que desembocar neste perigoso absurdo: tratar certos humanos como animais. Assim se revela porque falamos de falsa inocência dos animalismos.
A História ensina-nos que sempre que certos regimes pretenderam degradar os humanos, os trataram como animais: eugenismos, racismos, genocídios.
O (bom) tratamento dos escravos era visto como um problema de bem-estar animal.

Preservar a diferença essencial entre Humanos e Animais é um dever moral, social, político.
José R. dos Santos, Évora, 6 de Maio de 2016.

1 comentário: